segunda-feira, 16 de maio de 2016

Você quer viver um conto de fadas?


 Quando ainda bem pequenas (os), ouvimos nossas dedicadas mães e pais sentados à beira de nossa cama, contarem histórias de princesas, sapos, príncipes, bruxas e final feliz (ou com pais menos dedicados, vemos pela Tv mesmo). São inúmero contos: Branca de Neve, Cinderela, Rapunzel, Bela Adormecida, entre outros tantos roteiros.  Assim, construímos em nós, história por história, uma imagem de relacionamento e de parceiro que, em um futuro, garantirá nada mais, nada menos do que o eterno e tão esperado “final feliz”. Crescemos acreditando no mito do príncipe encantado e das princesas, que os problemas das relações são causados por bruxas, nos esforçando para sermos princesas, principalmente, acreditando que só seremos felizes no fim! Passamos a vida esforçando para sermos sempre melhores, mais bonitas, mais independentes – e não há problema nenhum nisso, a não ser quando começa a ser um problema - e muitas permanecem na espera pelo encontro com um príncipe encantado (princesa) que vá recompensar por todo esse esforço. Alguns homens e mulheres nunca irão encontrar o tão sonhado príncipes e princesas, pois tamanha é a criação dessa imagem e as expectativas sobre ela, que este só pode mesmo existir em contos de fada. Vivem começando e terminando relacionamentos, queixando-se, afinal, ninguém irá suprir tamanha expectativa. Outras desistem de tentar ser príncipe e princesa, diminuem o grau de exigência consigo e com o outro e encontram, sim, não um parceiro, alguém com quem podem compartilhar uma vida. É o toque da varinha mágica que em um "plim" (na psicologia podemos também chamar de "insight") traz o auto-perdão e a compreensão, e muda o olhar para si e para o mundo. Primeira etapa da história vencida: o parceiro(a) já foi encontrado! Mas aí chegam as bruxas! Malditas bruxas que sempre rodeiam os relacionamentos. Elas são o próximo obstáculo para o tão sonhado final feliz! Porém, o que não nos damos conta, é que muitas vezes a bruxa existe dentro de nós na forma de insegurança, ciúmes, impaciência...por medo de que a história  de amor acabe. E desta forma a vida vai sendo levada, a relação desgastada...e o esperado final reticente de promessas eternas de felicidade? Há pessoas que se relacionam a vida inteira com o sapo cururu na esperança que, no fim (do esforço, do sofrimento), ele se torne um príncipe (princesa).  Estes, na verdade, não existem. O fim de qualquer história, aliás, pode acontecer em qualquer momento da sua vida, naquele mais inesperado, sem dar tempo da felicidade acontecer somente com o virar das páginas da vida. Vivemos na esperança de uma felicidade que acontece somente no fim, e continuamos convivendo durante toda história com bruxas internas. Já que o fim real pode chegar a qualquer momento, as bruxas irão sempre existir, os príncipes e princesas são impossíveis de encontrar e também muito difícil de se tornar, o importante é nos despirmos desses papéis, criarmos nossa própria história, encarar as bruxas e pedir emprestado a vassoura para varrer o que for limitante para fora da sua vida e desfrutar de um vôo esplêndido - seja em qual área da vida for, amorosa, profissional, familiar – e sermos felizes hoje, com ou sem príncipes, com uma amiga com poderes místicos de alegrar seus dias, quem sabe, pois o fim da história pode demorar demais pra chegar, ou o real chegar muito cedo.

Outono

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Gosto tanto desses dias! Um friozinho aconchegante que torna nossa cama sempre convidativa. É gostoso ir dormir, e, por que não, também gostoso acordar. Até 5 minutos mais cedo! Isso, mais cedo! Para poder espreguiçar, curtir esse despertar, como não fazemos no dia-a-dia de horários corridos e relógios atrasados. Simples prazeres que me fazem tão bem.


Mas o que me desperta (interesse) são os casacos, as blusas de frio. Porque no outono os dias são assim: frio matutino e noturno intercalados com o calor da tarde. Ok, não é um calor absurdo, mas fica mais quente. E as pessoas saem de casa pela manhã para trabalhar, ir à faculdade, enfim, suas atividades cotidianas e vestem seu confortável agasalho. Com o passar das horas e a movimentação da terra (ou vice-versa), o dia vai pegando ritmo, o Sol vai esquentando e o que acontece com a vestimenta de muitas das pessoas? Nada! Elas não tiram o agasalho mesmo que o calor esteja incomodando. Por que? Não sei. Cada um tem seu motivo: não sabem onde deixar a blusa, não incomodou o suficiente, nem perceberam que está quente, deixam pra lá. Sentem-se tão protegidas e aconchegantes ali que não retiram seus casacos mesmo que já não esteja tão agradável. Não fazem um movimento para se adaptarem ao momento. São tantas as formas de fazermos isso na nossa vida. É aquele emprego ruim, mas que dá segurança, a rotina que se instalou na relação e ninguém dá um passo nem pra melhorar, nem pra cair fora, a saúde que às vezes se esvai na falta de tempo para o exercício físico ou para aquela aula de dança que sempre quis fazer. Medo do novo, medo de arriscar, medo de “perder a blusa”, de se expor ao outro, à outra situação e perder essa segurança? Lembro-me de minha mãe comentar que adolescente não sente frio, sai a noite com roupas curtas e decotadas. Realmente, é característica da adolescência a coragem, o enfrentamento, o “se jogar”. Com os anos e o “amadurecimento, vamos nos vestindo cada vez mais, moldando às exigências da vida e esquecemos que podemos tirar a blusa  de vez em quando e usá-la quando precisarmos novamente, que a encontraremos ou buscaremos por ela quando necessário, que podemos amarrar na cintura ou jogá-la sobre os ombros, como nos sentirmos mais confortáveis e de acordo com o estilo pessoal. Mas às vezes é melhor pagar o preço do que tirá-la...Cada um sabe o quanto suporta de calor até decidir tirar a blusa, ou não. É uma questão de tempo.

Menino Sol- um conto de uma história real

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Estava ali, sentado no chão, aquele menino que tinha olhos brilhantes e molhados. Sua pequenez, sua postura e a tímida exploração da pequena sala mostravam quão singela era a doçura que havia naquele “clientinho”. Estava ali e não entendia o porquê. Explicar quem era  “A psicóliga”, como conseguia se referir à sua psicoterapeuta, parecia distante da real compreensão daquele menino que só concordava acenando que sim.
Teve medo de ficar com aquela estranha, medo que a mãe saindo da sala o deixasse com aquela estranha, medo do estranho que era aquilo tudo. Psicoterapia é coisa de dar medo até mesmo em adulto!
Tinha oito anos. Há pouco conheceu na prática o que seria ter uma mãe para chamar de sua. E um pai! Há seis anos viveu em abrigo, ou Lar, como costumavam chamar a Instituição que recebe crianças que foram separadas da família por decisão judicial, pois estão em situação de risco. Risco de viver com os pais. Não entendia quais riscos poderia correr com eles, mas o risco de não ter nenhum ele conhecia muito bem. Convivia com o medo e a falta.
Quando finalmente foi adotado, sentia tanta alegria de ter sua esperança realizada, tantas esperanças novas que podiam tornar-se reais, que tinha medo. Tanto medo! E agora, que tinha todos ali, pai, mãe, família, o que ele ia fazer? Como se comportar, como ser filho? Ter casa, um lar de verdade, um quarto, cama, brinquedos só seus, escola. Agora que as palavras tinham significado - lar, meu, nosso, família, limite, esperança – era difícil colocar tudo no lugar, sentimentos, comportamentos, relações, qual é o meu lugar no coração deles?
Então estava na escola e foi lá que os medos que eram grandes ficaram fortes... e brancos. Eram todos brancos. Professores, alunos, pais, paredes, todos brancos! E como não podia ser (mais) diferente, todos olhavam para ele. Em um instante, ele que até pouco tempo não tinha nenhum olhar, agora tinha todos. Medo. Era como se fosse o eclipse de toda aquela claridade, chamando a atenção de todos por ser negro, por ser um satélite tão pequeno e sem luz capaz de manchar o brilho de um astro vibrante e cândido. Sentiu-se ainda menor, diminuindo, diminuído. Ensimesmou. O mundo infantil (o interno e o externo) pode ser muito cruel.
E ali estou eu, “A psicóliga”, olhando aquele menino buscar com os olhos o seu lugar no tapete, o palco psicodramático, sem brinquedos. Seus olhos disparam para a porta quando ela está a fechar. Medo. Na cabecinha dele, o pensamento “- Será que serei abandonado mais uma vez?”. Pergunto se deseja que eu deixe a porta aberta e o convido para dar uma olhadinha para a sala de espera e certificar-se que sua mãe o espera, e que estará lá, até o fim. Sua mão miúda toca a minha, leve, fria. Confirma que sua mãe está lá e eu conquisto um ponto de confiança.
-Vamos brincar?
Seus olhos percorrem a sala em busca de brinquedos, e seu suave despertar de alegria se transforma em dúvida: -Com o quê?
Explico para ele que ali podemos brincar do que quisermos. Podemos ser quem quisermos, em qualquer tempo, passado, presente ou futuro. Podemos ser pessoas, ou alienígenas, como lá fora, na vida real, mas que principalmente, podemos ser também as pessoas e os alienígenas que quisermos ser, com poderes especiais ou simplesmente, diferentes.  Não demora muito e logo estamos representando papéis imaginários da vida real. Surgem lobos-maus, mundos a serem conquistados com guerras difíceis, demoradas, que por vezes tinham que continuar na sessão seguinte, mas que na sessão seguinte não tinham mais sentido. Reis, aviões, esconderijos. Falamos dos machucados, das brincadeiras, dos novos colegas.
Neste dia ele chegou animado. Corre-corre, pega-pega, rolamos no chão. Cinquenta minutos, é hora de ir.
Vigorosa animação contagia sua corrida. Seu pequeno braço, desordenado, choca-se com a quina da mesa. A quina da mesa e o machucado em cicatrização. Meio segundo lento se passa entre o momento em que imagino a dor vendo a “casquinha” sair de seu braço frágil e o meu olhar se volta procurando a expressão dele. Breve silêncio e vejo seu rosto se transformar  e para o meu espanto, e após puxar o ar, um grito:

- EU TAMBÉM SOU BRANCO POR BAIXO!!! 

Amor empoeirado




Passou pela porta de entrada e foi como se já fizesse muito tempo desde que esteve ali pela última vez. Com o passar dos dias, semanas, meses (já não sabia mais, tinha perdido a noção de quanto tempo) as coisas, por falta de cuidado, foram tornando-se empoeiradas: as cadeiras, os vasos, o sofá, o que tornava aquele lugar familiar. Passou, passaram despercebidos. Os porta-retratos indicavam que alguém ali já tinha sido feliz, um casal, uma família que existiu. Ainda existe? Ainda existe. Mesmo sem saber o porquê, essa resposta parece ser a única, ainda que não lhe traga conforto. Caminha por ali, cansado, chegando do trabalho. Observa em silêncio. O descuido do dia-a-dia fez com que chegasse a este ponto de distanciamento. Não sente-se a vontade para sentar-se ali. Não enxerga mais. Não sente-se a vontade pra dizer à sua esposa, ali, no sofá, aquele “eu te amo”. Amor estampado agora encoberto. Esposa. Tanta intimidade. Conhece aquele corpo, o toque, mas não mais os sentimentos. Não mais seus sentimentos. Percebendo neste momento tudo que rodeia esta casa, reconhecendo num olhar atendo à TV um brilho singelo que há muito não percebia (não que não estivesse ali, mas que realmente não foi percebido), tomado por uma motivação estranhamente adormecida que lembra- se ter possuído no princípio de tudo, de súbito seu olhar se levanta e solta como quem fez uma grande descoberta: “Maria, levanta deste sofá! Está na hora de arrumar a casa.”

Automutilação - perguntas e respostas

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Já se tornou comum adolescentes praticarem a automutilação e divulgarem fotos das cicatrizes nas redes (Instagram e Whatsapp, por exemplo). O que explicaria esse comportamento? É uma moda? É uma tentativa de chamar atenção ou uma busca compreensível por apoio?
 
Vivemos em um momento social em que o que não é visto não é sentido, e o que não é compartilhado, perde seu valor de vivido. Em geral, as pessoas tendem a ter dificuldades em compreender o que não pode ser quantificado,  que não está concreto como uma ferida aberta. Pessoas com  depressão ou fibromialgia, por exemplo, sofrem com este preconceito, com a dificuldade de compreensão e o julgamento por não terem “uma causa e ferida real”. A automutilação, longe de ser uma moda, é um sintoma do nosso tempo, de como os adolescentes estão vivenciando os acontecimentos e onde e como estão encontrando formas de expor as suas dores subjetivas. No corpo e na internet, o subjetivo se torna real. É preciso ter um olhar diferenciado para não banalizar algo que é tão forte internamente que chega ao ponto de ultrapassar a barreira da dor física, tão evitada. Sim, é também um pedido por ajuda e apoio.
 
- Muitas das imagens que vimos compartilhadas são bastante comentadas, geralmente com palavras de apoio e expressões de superação. De alguma forma, esses comentários podem ajudar a pessoa que pratica a automutilação? Como?
 
Este apoio pode ser uma moeda de duas faces. Por um lado pode oferecer um suporte, o compartilhar de experiências proporciona um sentimento de pertencimento, de não estar só, de não ser o único a viver esta situação. Nesse momento, sentir-se amparado pode ser reconfortante.
Por outro lado, por a internet ser um “lugar público”, a pessoa que se expõe está sujeita a todo tipo de comentário, inclusive os julgadores e depreciativos, que podem agravar a situação. Também há muitas pessoas que se disponibilizam para ajudar, passam seu número de telefone. É preciso cautela, já que pode ser alguém que queira se aproveitar de alguém que está claramente fragilizado.
Também é preciso ter um olhar cuidadoso de como a pessoa percebe as “curtidas”, se as sente como sinal de aprovação do seu comportamento, transformando-se assim em um reforçador da conduta.
 
 
- Conversar com pessoas que também se automutilam pode ser uma boa estratégia para lidar com o problema? Por quê?
 
Sim, com certeza. O compartilhar permite a troca de vivências e a compreensão dos sentimentos. Poder falar do problema com alguém que também o vive gera sentimento de aceitação, de não julgamento. Será através do espelho que o outro faz que poderá se reconhecer e diferenciar, também tirar o peso do estigma unicamente de si. Conversar com outras pessoas também pode esclarecer e apontar caminhos e estratégias de como os outros estão fazendo para lidar com aquela situação, ajudando a pessoa a criar recursos de enfrentamento para ultrapassar esse momento difícil.
 
- Os cortes costumam ser a expressão de outro problema que o adolescente passa? Quais?
 
Sim. São muitas as questões que o adolescente tem que enfrentar nesta fase. A mudança corporal, a explosão hormonal, a descoberta da sexualidade. Também nesta fase é chamado a responder a cobranças sociais quanto à responsabilidades com o futuro, com a futura profissão,  tudo isso misturado com a necessidade de fazer amigos, fazer parte de um grupo. Aliados a este turbilhão de acontecimentos e seus efeitos, a ansiedade e depressão advindos do bullying e de outras situações, falta de comunicação de qualidade entre pais e filhos e sentimentos como o de inadequação, incompreensão e solidão podem ser expressos em cortes.
 
 
- O que essas pessoas sentem quando se cortam?
 
Os cortes produzem uma reação natural do cérebro de liberação de endorfina, que pode gerar uma sensação de prazer. Além da sensação física, a pessoas que se automutilam relatam sentir alívio ao transferir o foco dos sentimentos vividos no mundo interno como tristeza, angústia, ansiedade, raiva, frustração, medo e solidão para o foco na dor física, proporcionando um desafogo momentâneo. Em alguns casos, sentimento de poder sobre o próprio corpo.
 
- Vi cortes em diferentes partes do corpo –no pulso é mais comum, mas havia também na barriga, por exemplo. Umas das meninas que postou uma imagem de cortes na barriga fez uma legenda que indicava que também se sentia gorda. Nesse caso, o corte também pode ser uma maneira de exibir a insatisfação com determinada parte do corpo?
 
Diria que o que está expresso não é somente a sua insatisfação com determinada parte do corpo, mas seu sentimento em relação a ser rejeitada, e então, rejeitar-se e punir-se, advindos da cobrança e da inadequação diante dos padrões de beleza impostos socialmente. A percepção sobre si e sobre o mundo pode ficar bastante negativa nessas circunstâncias.
 
- Como e onde essas pessoas podem buscar ajuda?
 
Conversar com os pais seria o primeiro passo. É importante haver espaço em casa para se falar o que sente, sobre o que pode estar acontecendo que tenha levado à esse comportamento. Algumas mudanças práticas que ajudam com o problema são fáceis de serem realizadas, como a troca do colégio, por exemplo. Procurar ajuda do psicólogo é de grande valia para pais e filhos, já que os pais muitas vezes não sabem como reagir e podem acabar agravando a situação se não souberem como acolher e abordar o assunto. O psicólogo irá fazer o acompanhamento do caso e avaliará a necessidade de encaminhamento para um psiquiatra.
 
- Como os pais podem identificar que o filho está se automutilando? Quais são os sinais?
 
Mudanças comportamentais, como ficar mais introspectivo, excesso de mau humor, mudança nas vestimentas  na tentativa de esconder os cortes, como usar blusa de frio em dias quentes ou deixar de usar saia,  comportamentos evitativos de toque ou exposição, como deixar de ir o clube, não ficar nu ou semi nu na frente dos pais e irmãos. Os pais devem estar atentos à diminuição de remédios e curativos, ao sumiço de objetos cortantes como lâminas de barbear. O sinal de alerta se acende caso os encontre no quarto do filha (a), em meio aos seus pertences pessoais. Estar atento ao conteúdo da fala do filho, o que ele diz e sente sobre a escola, sobre os amigos, sobre a vida fornecem indícios preciosos caso o conteúdo seja carregado de pessimismo, negativismo.
 
 
- E como os pais podem ajudar os filhos?
 
A descoberta deste comportamento pode ser muito assustadora para os pais.
Os pais podem ajudar aos filhos buscando informações sobre o assunto e procurando a ajuda profissional de um psicólogo. Os pais também podem buscar ajuda para si, procurando a orientação de um psicólogo, onde poderá falar de seus sentimentos e de como tem tentado lidar com a situação.  
 Matérias como esta são importantes ferramentas que contribuem para pais mais conscientes, menos julgadores, mais acolhedores e compreensivos. Se há um problema, há um porquê por trás que precisa ser investigado. Descobrir a origem do problema que pode ter raízes profundas ajudará não só a lidar com a situação atual, mas a sua solução e resignificação poderá ajudar seu filho a ser um adulto com mais recursos adequados para lidar com os próximos problemas que virão.

Automutilação


                                                           

O ato de mutilar-se é muito difícil de ser compreendido pela maioria das pessoas. A dor, tão evitada, quando provocada, causa estranheza e repúdio. É preciso olhar de perto esta situação, aproximar-se para entender melhor e poder oferecer respostas mais adequadas àqueles que estão passando por isso. Mas há dois lados nessa moeda: a dos pais, familiares, amigos e a das pessoas que se automutilam.

Aos pais, familiares, amigos, sociedade:

Não digam que é para chamar atenção. Psicopatologias geralmente provocam este tipo de comentário por não terem uma causa evidente, um mosquito que picou, uma falta de vitamina, uma comprovação em exame de sangue. Geralmente os cortes são feitos em lugares que podem ser escondidos, como a parte interna das pernas. Logo, a maioria dos casos não é para chamar atenção, se fosse, seria em lugares visíveis, assim teriam muita atenção.
Uma das possíveis causas é o sofrimento com bulling, a questão de imagem e, principalmente, a falta de conversas abertas e acolhimento sobre esta e outras dificuldades que a pessoa pode estar enfrentando. Para a pessoa que se automutila, seria uma forma de tornar real, de trazer para o corpo, concretizar a dor interna. Em tempos em que o virtual  está tão presente e se sobrepondo ao real, tornar real essa dor pode ser um pedido por relações concretas e verdadeiras, onde há lugar para dores, imperfeições, desafetos, tristezas. É muito difícil sustentar tanta felicidade  quanto a das redes sociais.  É comum ler nos relatos a necessidade do sorriso no rosto para encarar a sociedade, enquanto se esconde a dor que se revela no privado, em lugares onde o mais íntimo, real e rejeitado podem ter lugar: o banheiro ou o quarto. Nesses lugares você pode ser quem você é: Humano, com o que há de melhor e pior. Ficar nu, lidar com seus cheiros e excrementos, lidar com as lágrimas, sua dor e o espelho. Nos outros ambientes sociais, dentro ou fora de casa, o que vale é o imperativo da felicidade, do estar bem. O adolescente fora desse padrão é rechaçado.
Sim, algumas pessoas se auto mutilam como uma forma de desafio ou motivado pela necessidade de pertencimento, para ser “legal”. Não cabe a ninguém julgar e definir entre comportamento que expressa dor subjetiva ou que expressa um desejo de aceitação. Em todos os casos, se você conhece alguém que pratica a automutilação, seu filho ou amigo, e você tem o real interesse em ajudar, aproxime-se, converse, compreenda e assim que possível, encaminhe para um profissional onde ele poderá ter os cuidados necessários

Às pessoas que se automutilam:

Por outro lado, vejo pais que não querem ver simplesmente porquê não sabem o que fazer, não sabem lidar com essa dor e com essa manifestação tão concreta. Afinal, não é uma das reações quando se tem medo, esconder embaixo das cobertas, cobrir os olhos, tapar os ouvidos? Temos adultos despreparados, tentando lidar com seus próprios fantasmas e com o próprio mundo real de responsabilidades.
Ser adulto também é difícil e a vida impõe seus desafios constantes em sua caminhada. Geralmente achamos que o adulto tem mais sabedoria por ter mais experiência de vida, mas e quando ele tem que lidar com algo novo, uma reação que desconhece como a da automutilação? Adulto também se perde e precisa de muita conversa para compreender o está acontecendo sem julgar. Entendo que é difícil falar, às vezes por falta de tempo, por distanciamento, perda da intimidade, mas conversar sobre o assunto poderia ajudá-lo a entendê-lo e assim te ajudar também, com outros recursos que já aprendeu como adulto.

O ato de cortar-se produz uma reação do cérebro que libera endorfina, e essa substância pode viciar e tornar este comportamento repetitivo. Este é um comportamento que você aprendeu e que talvez te sirva (serviu) por um tempo para lidar com alguns sentimentos. Uma estratégia que ajuda a quebrar esse ciclo vicioso é colocar gelo na região que se automutila. A área ficará anestesiada, dormente e o cérebro não liberará a recompensa da endorfina. Procurar pessoas para conversar, falar sobre seus sentimentos pode ajudar a deixar as coisas mais claras para você. Os profissionais “Psi”, psicólogos e psiquiatras, podem oferecer um suporte para você e sua família.

Traumas

Resultado de imagem para trauma emocionalImagine que em, em sua vida, sofrerá diversos machucados. Pequenos arranhões, feridas, cortes profundos. Não é difícil imaginar isso, não é?! Afinal, quem nunca passou por quedas e pequenos acidentes no caminho?
Mas imagine que uma dessas feridas foi profunda. Ao contrário das outras que sumiram ou são leves cicatrizes que viraram história, essa ferida não se curou sozinha. Aconteceu algo e ela inflamou.  Agora imagine que essa ferida foi no ombro.
Então essa ferida está lá há muito tempo. Está com você desde quando era pequeno ou desde que aconteceu aquele incidente e você tenta escondê-lo, coloca bandagens, curativos, tenta diversos remédios, sem sucesso. Às vezes alguém coloca o dedo na ferida, e a dor é como a primeira vez, pois está inflamada. Você chora. Você passa a se proteger mais, tenta evitar que outro machucado desse aconteça. E essa inflamação começa a expandir e prejudicar tendões, nervos, músculos, começa a prejudicar também a função da mão.
Então, aquela ferida que não cicatrizou agora te limita em outras funções, te impede de realizar tarefas simples.
Assim é quando um trauma acontece. Diferente de outros acontecimentos ruins, o trauma deixa um registro doloroso e, muitas vezes, limitantes, que acabam por influenciar o modo de agir e reagir a outra situações da vida, influencia o olhar diante das situações. Um trauma pode causar dificuldades de sair de casa, de trabalhar, de dormir e até, de amar.

A psicoterapia proporcionará uma chance de curar esta ferida. Especificamente para traumas, a Terapia EMDR é muito eficaz. O psicólogo é um especialista. Como ela está inflamada, não pega anestesia. Sim, vai doer mexer nessa ferida, falar sobre esse trauma. Mas é necessário abrir, olhar, limpar direitinho cada canto, e aí então essa ferida poderá ir se fechando. Você descobrirá recursos em si mesmo para lidar com ela, para cuidar dela com esse especialista em lidar com dores e feridas que afirma e confia que o melhor remédio sempre esteve com você e que, no tempo dela, essa ferida será mais uma cicatriz e a lembrança de história de superação e aprendizados para contar, livre para viver imprimindo um novo olhar sobre o mundo.